10 outubro 2024

Cisma e Espiritismo

“As famílias felizes são todas iguais; cada família infeliz o é à sua maneira.” Frase do escritor russo Leon Tolstói, que abre o seu romance Anna Karenina.

O termo “cisma” significa ruptura, divisão e cisão com que se verifica em qualquer área de atuação humana. Contudo, o cisma está mais ligado às religiões. Nesse sentido, temos O Grande Cisma, que é a divisão entre a Igreja Católica Romana e a Igreja ortodoxa Oriental, ocorrida no século XI, A Reforma Protestante, iniciada por Martinho Lutero no século XVI. Além desses dois, temos:  o Cisma de Avignon (século XIV) e o Grande Cisma do Ocidente (século XIV).

As causas comuns dos cismas são: 1) divergências doutrinárias, ou seja, desacordos sobre crenças e interpretações de textos sagrados; 2) disputa de poder, isto é, luta pela liderança de uma organização; 3) questões políticas, como a formação de alianças; 4) questões sociais, como a posição da mulher e a igualdade entre as pessoas. As consequências são: fragmentação, conflitos, levando a guerras e intolerância, e o surgimento de novos movimentos religiosos e novas ideologias.

Tendo consciência de que o Espiritismo, como qualquer movimento filosófico ou religioso, não está imune a divisões internas, Allan Kardec externou muitos alertas a respeito de futuras divergências na seara espírita. Em suas obras e mensagens, ele destacou alguns pontos cruciais sobre a importância da unidade e os perigos das divisões: personalismo e vaidade, interpretações equivocadas, fantasias e propostas místicas, interesses políticos e ideológicos e importância da fraternidade.

No item II — "Autoridade da Doutrina Espírita. Controle Universal do Ensino dos Espíritos", da introdução de O Evangelho Segundo o Espiritismo, Allan Kardec diz que a universalidade do ensino dos Espíritos é uma garantia poderosa contra os cismas, pois o conhecimento espírita foi construído por uma plêiade de Espíritos superiores e não por um único homem. Eis um trecho de suas palavras:

"Se, portanto, o Espiritismo é uma verdade, ele não teme nem a má vontade dos homens, nem as revoluções morais, nem as transformações físicas do globo, porque nenhuma dessas coisas pode atingir os Espíritos". "Mas não é esta a única vantagem que resulta dessa posição excepcional. O Espiritismo ainda encontra nela uma poderosa garantia contra os cismas que poderiam ser suscitados, quer pela ambição de alguns, quer pelas contradições de certos Espíritos. Essas contradições são certamente um escolho, mas carregam em si mesmas o remédio ao lado do mal".

Na Revista Espírita de 1861, encontramos: "Resta-me ainda vos dar alguns conselhos — embora os vossos guias muitas vezes já vos tenham dado — mas que minha posição pessoal e a atual circunstância me aconselham a vos lembrar novamente. Meus amigos, aqui me dirijo a todos os espíritas, a todos os grupos, a fim de que nenhuma cisão, nenhuma dissidência, nenhum cisma venha surgir entre vós, mas, ao contrário, que uma crença solidária vos anime e vos reúna a todos, pois isto é necessário ao desenvolvimento de nossa doutrina benfazeja".

Ao tratar da materialidade das penas eternas, na Revista Espírita de 1864, Allan Kardec diz: "Não se julgue esta uma questão de menor importância, pois contém em si o germe de toda uma revolução religiosa e de um imenso cisma, muito mais radical que o protestantismo, porque não ameaça apenas o catolicismo, mas o protestantismo, a Igreja grega e todas as seitas cristãs. Com efeito, entre a materialidade das penas e as penas puramente morais, há toda a distância do sentido próprio ao sentido figurado, da alegoria à realidade. Desde que se admitam as chamas do inferno como alegoria, torna-se evidente que as palavras de Jesus: “Ide ao fogo eterno” têm um sentido alegórico. Daí a consequência de que o mesmo deve acontecer com outras de suas palavras".

Como vemos, Allan Kardec defendia a universalidade e a unidade do movimento espírita para que a doutrina se consolidasse como um propulsor do progresso espiritual de todos. Por isso, alertou sobre os perigos da divisão e da fragmentação, incentivando sempre o diálogo, a tolerância e o respeito às diferentes opiniões.

 

 

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