16 setembro 2025

Jesus e César

 A relação entre Jesus e César pode ser vista:

1) Histórico-política: César simboliza o poder imperial romano, que dominava a Palestina na época de Jesus; Jesus, por outro lado, representava uma proposta espiritual e ética que não se confundia com o poder político, mas também não o ignorava; a frase “Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus” mostra essa distinção: reconhecer a legitimidade da ordem civil sem confundi-la com a esfera divina.

2) Teológica: O contraste entre o Reino de Deus e o reino terreno: César representa a ordem mundana, marcada por poder, impostos, hierarquia e violência; Jesus anuncia um Reino baseado em justiça, amor, humildade e serviço. Enquanto César exigia culto e lealdade absoluta, Jesus rejeita esse tipo de idolatria ao Estado, reafirmando que só Deus merece adoração plena.

3) Filosófico e ético: O dilema entre obedecer às leis humanas e seguir a consciência espiritual. O ensinamento de Jesus inspira reflexão sobre até que ponto é legítimo obedecer à autoridade civil, principalmente quando esta entra em conflito com princípios éticos superiores.

Que poderia ter acontecido se Jesus recorresse à proteção de César? 

Se Jesus tivesse aderido à Cesar em vez de manter sua missão espiritual e profética, o mundo provavelmente teria sido muito diferente. Eis alguns cenários possíveis:

1) O desaparecimento do Cristianismo como o conhecemos: Se Jesus tivesse se submetido a César, sua mensagem teria sido diluída no pragmatismo político e talvez não tivesse passado de mais um movimento religioso local, integrado ao império romano. Sem a cruz e sem a resistência à lógica do poder, dificilmente haveria a mesma inspiração para mártires e comunidades que expandiram a fé.

2) A fusão entre religião e poder já no início: Ao seguir César, Jesus teria legitimado o império romano como parte do plano divino. Isso poderia ter criado uma religião imperial desde o começo, semelhante ao culto ao imperador. O cristianismo poderia ter se tornado apenas um braço religioso do Estado, sem a força transformadora de questionar injustiças.

3) Perda da ética revolucionária: O Sermão da Montanha, a opção pelos pobres, a crítica aos hipócritas e aos poderosos perderiam força. A ética de amor ao inimigo e perdão poderia ter sido substituída por uma moral de obediência e lealdade ao império. A mensagem de Jesus seria adaptada para justificar a ordem existente, e não para transformá-la.

4) Impacto cultural e histórico: Sem o cristianismo como religião independente, a história do Ocidente seria outra: Talvez não houvesse a mesma noção de dignidade da pessoa humana, vinda da ideia de que todos são filhos de Deus. Nem a mesma crítica ética às estruturas de poder. A cultura romana e grega teriam dominado sem contrapeso, e conceitos como caridade universal, misericórdia e perdão talvez não tivessem se espalhado.

Jesus e César 

Que seria do Cristianismo se Jesus recorresse à proteção de César?

Possivelmente, alguns patrícios simpáticos à nova doutrina se encarregariam da obtenção do alto favor. Legiões de soldados viriam garantir o Messias e os amigos do Evangelho alinhar-se-iam à força da espada, não mais de ouvidos espontâneos, mas com a atenção absorvida na postura oficial, Pedro e João, Tiago e Felipe adotariam certas normas de vestir, segundo os programas imperiais, e o próprio Cristo, naturalmente, não poderia ensinar as verdades do Céu, sem prévia audiência das autoridades convencionalistas da Terra. Provavelmente, o Mestre teria vencido exteriormente todos os adversários e dominaria o próprio Sinédrio.

Mas... e depois?

Sem dúvida, ter-se-ia fundado expressiva e bela organização político-religiosa, repleta de preceitos filosóficos, severos e regeneradores. Mateus teria envergado a túnica do escriba estilizado, enquanto Simão gozaria de honras especiais e o próprio Jesus passaria à condição de um Marco Aurélio, cheio de austeridade e nobreza, interessado em ensinar a justiça e a sabedoria, mas em cujo reinado se verificariam perseguições das mais terríveis e sangrentas ao Cristianismo, sem que as ocorrências dolorosas lhe merecessem consideração.

O Mestre, contudo, compreendia a necessidade das organizações humanas, exemplificou o respeito à ordem política, mas, acima de tudo, serviu ao Reino de Deus, de que era representante e portador, neste mundo de experiências provisórias, dirigindo seu Evangelho de Amor, não só ao homem físico, mas essencialmente ao homem espiritual.

Sabia Ele que as organizações religiosas, propriamente ditas, existiam entre as criaturas, muito antes dos templos de Baal. Urgia, porém, entregar aos filhos da Terra a herança do Céu, integrá-los na doutrina viva do bem e da verdade, estabelecer caminhos entre a sombra e a luz, aperfeiçoar caracteres, purificar sentimentos, elevar corações, instituir a universidade do Reino de Deus e sua justiça. Entendia que a sua obra era de semeadura, germinação, crescimento, tempo e trabalho constante.

E plantou com o seu exemplo o Cristianismo sublime no campo da Humanidade, ensinando o acatamento a César, cooperando no aperfeiçoamento de suas obras, mas fazendo sentir que César constituía a autoridade respeitável no tempo, enquanto o Pai guarda o poder divino na eternidade.

Na exemplificação do Cristo, o Espiritismo evangélico, na sua condição de Cristianismo redivivo, deve procurar as suas diretrizes, edificantes no terreno da nova fé. As organizações políticas, de natureza superior, são sempre dignas e respeitáveis e todos os seguidores do Evangelho devem honrar-lhes os programas de realização e progresso coletivo, acatando-lhes as instituições e contribuindo para o seu engrandecimento, na esfera evolutiva, mas não se pode exigir, da política de ordem humana, a solução dos problemas transcendentes de ordem espiritual.

Na atualidade do mundo, o Espiritismo é aquele Consolador prometido, enfeixando nova e bendita oportunidade de redenção. Em seu campo doutrinário, a verdade de Deus não está algemada, seus felizes estudantes e seguidores podem aquecer o coração ao sol da liberdade íntima, sem obstáculos na marcha da consciência para a realização divina.

Aos espiritistas dos tempos novos, portanto, surgem lições vivas, que não podes relegar ao esquecimento.

O sacerdócio organizado costuma ser o cadáver do profetismo, Oculto externo nem sempre favorece a luz da revelação. A teologia, na maior parte das vezes, é o museu do Evangelho.

Urge, pois, em todas as circunstâncias, não olvidar Aquele que auxiliou romanos e judeus, atendendo ao povo e respeitando as autoridades, dando a César o que era de César e a Deus o que é de Deus, ensinando, porém, que o seu reino ainda não é deste mundo. (Capítulo 8 do livro Coletânea do Além, pelo Espírito Emmanuel, psicografia de F. C. Xavier)


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