11 fevereiro 2009

Teoria e Prática no Espiritismo

O termo teoria – do grego theoria – é usado em várias acepções. Na Origem, designava o ato de ver e de ser visto em locais abertos a todos, tais como o templo, o circo, a ágora e em espetáculos e cerimônias públicas. Pode ser também a ação de contemplar, ter uma visão do espírito. Os gregos, de maneira nenhuma opunham, como hoje, teoria e prática. O conhecimento teórico, em toda a antiguidade clássica grega, era entendido como a contemplação da verdade (aletheia) em si mesma. A supremacia do conhecimento teórico sobre o prático ou técnico provém do fato de ele ser útil em si mesmo, independentemente de sua aplicação exterior.

Hoje, o vocábulo teoria é usado, as mais das vezes, como oposição a prática, a ponto de muitas pessoas dizerem que "a teoria na prática é outra". Com isso, não são poucos os pensadores que acabam dando mais importância à prática do que à teoria. Os homens práticos, ou seja, aqueles que estão à frente de atividades empresariais e governamentais ganham cada vez mais notoriedade, principalmente pelas suas aparições nos veículos de comunicação de massa.

Reflitamos um pouco sobre a relação teoria-prática num Centro Espírita. Anotemos, primeiramente, algumas frases: "você fez todos os cursos que o Centro oferece e nunca trabalhou?"; "você terminou o curso de Educação Mediúnica e ainda não trabalha?"; "você precisa trabalhar, senão será presa fácil de Espíritos menos felizes"; "você precisa aplicar passes senão as suas energias ficam paralisadas"; "as suas dores nas costas são devido à energia acumulada. Aplique passes e os seus problemas serão resolvidos".

Ser expositor dos cursos é prático ou teórico? A pessoa que só dá aulas pode ser considerada um trabalhador espírita, ou somente o que trabalha no setor de passes? O instrutor não necessariamente precisa participar do trabalho de passes. Ao estudar e transmitir a Doutrina Espírita já estará prestando um grande serviço à causa espírita. Pode, nas suas instruções, disseminar ideias, propor mudanças comportamentais para aquele que vai somente aplicar passes.

A teoria deve sempre vir antes, porque é dela que as idéias emergem e se estabelecem os princípios de uma doutrina, de uma ciência ou de um sistema filosófico. José Herculano Pires adverte-nos que todos aqueles que se dizem espíritas deveriam, em primeiro lugar, debruçar sobre as obras básicas, que são os fundamentos teóricos para as nossas ações práticas. Sem elas, o edifício espírita pode ruir.

O espírita sincero não deveria praticar o Espiritismo somente nos Centros Espíritas. Ele deve ser espírita em qualquer lugar do mundo. Alguém chega até nós e nos pede uma informação. Nesse exato momento, podemos passar o conteúdo doutrinal do Espiritismo, sem que precisemos colocar o rótulo: "Sou Espírita". O verdadeiro espírita e o verdadeiro cristão serão reconhecidos por sua transformação moral à luz dos ensinamentos de Cristo. Não é somente dando passes, mas transformando-se para a prática do bem.

Em filosofia, aprendemos que vivemos em função dos outros, quer atendendo às suas necessidades quer eles suprindo as nossas. E não são poucas as coisas que dependemos dos outros. O pão que nos mitiga a fome, por exemplo, passou por diversas mãos. A prática deve ter como base a teoria. Como o Espiritismo tem conexão estreita com a filosofia, não resta dúvida que o nosso principal empenho é a correção do intelecto. Nesse sentido, temos que dar ênfase aos acertos e buscar as razões do fracasso.

Tenhamos em mente a prática espirita. Não nos esqueçamos, porém, dos princípios teóricos que lhe dão guarida.

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"O homem, que apenas dispõe do pensamento para investigar o que escapa aos sentidos, o que não se vê com os olhos do corpo nem se ouve com os ouvidos desse mesmo corpo, é o investigador de um saber que ultrapassa a mera experiência sensível. Esse homem ávido de conhecer, que ordena o caótico dos acontecimentos díspares, que os classifica em ordens diversas, que busca o que os conexiona, que os teoriza, é, em suma, o filósofo. Essa palavra teoria, que vem do grego theoria, significa em sua forma etimológica visão. Mas também os gregos chamavam theoria as longas filas dos fiéis que vinham de todos os quadrantes da Grécia ao Templo de Delfos para prestar homenagens aos deuses. E como traziam festões de flores, que os ligavam entre si, aproveitaram-se desse termo os sábios para com ele indicar tudo quanto conexiona, uma série de fatos. Ora, o saber filosófico não é o saber comum, o saber empírico, mas um saber teórico. Desse modo, a Filosofia é um saber teórico, que conexiona, que busca relações, que unem as coisas e as razões, primeiras e últimas, que as explicam e que as justificam". (SANTOS, M. F. dos. Convite à Filosofia e à História da Filosofia. 6. ed., São Paulo: Logos, s.d.p., pág. 16)

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