Para o Espiritismo, o esquecimento do passado é uma bênção, pois reforça
a ideia de que Deus não faz nada que seja inútil ao nosso progresso espiritual.
Suponha que tenhamos assassinado alguém em outra encarnação e, que, nesta, essa
pessoa é membro de nossa família. Como seria o nosso relacionamento, permeado
incessantemente de remorso, pela falta cometida?
Como a lei divina e natural age sempre
em nosso benefício, esse esquecimento provisório dá-nos mais liberdade de ação,
pois sem a lembrança não há o que remoer. De qualquer maneira, nada fica
esquecido por completo, e havendo necessidade, podemos acessar as ocorrências
de outras encarnações, pois elas ficam gravadas na memória do nosso Espírito
imortal.
A reencarnação é uma oportunidade de
progresso. Allan Kardec, em Obras Póstumas, quando analisa o
caminho da vida, fazendo referência à metáfora da floresta, diz-nos que se um
indivíduo foi ladrão e assassino numa delas, poderá retornar apenas como
ladrão, não tendo mais o desejo de matar as pessoas. Para que teria necessidade
de se lembrar que também foi assassino? Não seria melhor concentrar-se na
vitória sobre ser ladrão?
Cada um de nós tem o seu estoque de
erros e acertos. Tudo fica registrado na contabilidade divina. Os Espíritos nos
orientam que, mesmo tendo o esquecimento do passado, esses registros podem vir
em forma de intuição para determinados projetos de vida. Quer dizer, nada fica
totalmente incólume. O progresso é compulsório: podemos nos enganar adiando o
seu avanço, mas chega uma hora em que não teremos outra opção senão ceder à sua
força.
Em se tratando do progresso, quanto
mais conhecimento maior a nossa responsabilidade e, por essa razão, seremos
mais cobrados. Nesse caso, seria melhor não saber para não ser punido. Mas o
progresso avança e não adianta lamentar, mas enfrentar a vida tal qual ela é.
Todos começamos simples e ignorantes. Para atingirmos a qualidade de Espíritos
perfeitos, haverá muita luta e muito esforço, pois nada nos vem de mão
beijada.
Caso não tenhamos a força necessária para tal empreendimento,
lembremo-nos das orientações de Jesus, que sempre nos orienta a tomar o caminho
do meio, da ponderação e da obediência às leis de Deus.
Complemento
— Retomar o contato com os melhores,
seria recuperar igualmente os piores — atalhou Clarêncio, bondoso — e,
indiscutivelmente, não possuímos até agora o amor equilibrado e puro, que se
consagra aos desígnios superiores, sem paixão. Ainda não sabemos querer sem
desprezar, amparar sem desservir. Nossa afetividade, por enquanto, padece
deploráveis inclinações. Sem o esquecimento transitório, não saberíamos receber
no coração o adversário de ontem para regenerar-nos, regenerando-o. A Lei é
sábia. De qualquer modo, porém, não olvidemos que nosso espírito assinala todos
os passos da jornada que lhe é própria, arquivando em si mesmo todos os lances
da vida, para formar com eles o mapa do destino, de acordo com os princípios de
causa e efeito que nos governam a estrada, mas somente mais tarde, quando o
amor e a sabedoria sublimarem a química dos nossos pensamentos, é que
conquistaremos a soberana serenidade, capaz de abranger o pretérito em sua
feição total... (Capítulo VIII — "Deliciosa excursão", do
livro Entre a Terra e o Céu, pelo Espírito André Luiz)
O problema do
esquecimento
Quando o benfeitor
terminou, indaguei então acerca do meu próprio estado íntimo. Já que findara
minha existência no veículo de carne, por que não reentrar na posse do passado?
Por que razão não lembrava o período anterior ao meu retorno à carne? Por que me
surpreendia, ante os espetáculos da vida livre, se da vida livre me ausentara,
um dia, a fim de reencarnar-me? Não seria a morte simples regresso da alma no
pátrio lar? Em que causas se me enraizaria o esquecimento?
O Irmão Andrade
ouviu-me sereno e informou que a reencarnação e a desencarnação constituem
vigorosos e renovadores choques para o ser e que se, em alguns casos, era
possível o reajustamento imediato da memória, quando a criatura já atingiu
significativo grau de elevação, na maior parte das vezes a reabsorção das
reminiscências se verifica muito vagarosa e gradualmente, evitando-se
perturbações destrutivas.
Podemos simbolizar
a mente numa casa suscetível de povoar-se com valores legítimos ou
transitórios, quando não esteja atulhada de inutilidades e viciações.
Alimentando-se na Crosta da Terra com muitas ideias e paixões não perduráveis,
aproveitadas pelo Espírito apenas por material didático, a não ser em processo
expiatório, para esvaziar-se do mal ou da ilusão, não lhe é possível o mergulho
indiscriminado no pretérito, medida essa que lhe seria ruinosa, mormente na
ocasião em que se desenfaixa do corpo denso, de carne.
Explicou que
alguns companheiros usam excitações e processos magnéticos para adquirirem a
lembrança avançada no tempo; no entanto, de acordo com a própria experiência,
aconselhava a submissão aos recursos da Natureza, de modo a retomarmos o
pretérito com vagar, sem alterações de consequências deploráveis, até que, um
dia, plenamente iluminados, possamos conquistar a memória integral nos círculos
divinos. (Xavier, F. C. Voltei, psicografia do Irmão Jacob,
capítulo 9 "Esclarecimentos")
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