Os primeiros
filósofos antes de Sócrates buscavam, nos elementos externos do ser, as
explicações racionais do mundo. Para Tales de Mileto, a substância primordial
era a água; para Anaxímenes, o ar; para Pitágoras,
o número; para Demócrito, o átomo. Sócrates, porém, não
via a filosofia como uma simples especulação filosófica; para ele, a filosofia
não pode estar desligada da própria vida, que é pessoal e social. Essa atitude
está condensada na máxima: "Conhece-te a ti mesmo", que é
autoconsciência ou uma volta reflexiva sobre si mesmo.
Sócrates não é o
autor da frase "conhece-te a ti mesmo". Na tradição mítica, essa
sentença foi proferida pelo deus Apolo, e estava gravada no frontispício do
templo de Delfos [A frase completa era: "Conhece-te a ti mesmo e conhecerá o universo e os deuses"]. Foi somente depois da sua visita a Cherofonte, o oráculo de
Delfos, que passou a refletir sobre o "conhece-te a ti mesmo". Este
dístico inspira-lhe dois diálogos, narrados em Platão (Alcibíades,
l28d-l29) e em Xenofontes (Memoráveis IV, II, 26), onde retrata a
importância do autoconhecimento.
O oráculo de
Delfos não ensinava filosofia. Sócrates interpretou essa ordem com um programa
e um método, ou seja, propunha a seus sucessores trabalhar para se conhecer, a
fim de se tornarem melhores. Ele, porém, não se iludia sobre as dificuldades
dessa tarefa. Ele as experimentou e morreu por isso. Nada tinha de misterioso.
Mas iria voltar a ser no momento em que os pensadores cristãos o adotassem e o
interpretassem por sua vez.
A filosofia é o
diálogo em busca da verdade. Como cada homem possui uma parte da verdade, ele
precisa da ajuda de outros seres humanos para ampliá-la. Sócrates enfatizava
que cada indivíduo deveria pensar por si mesmo, independentemente das ideias
preconcebidas ou da opinião da maioria. Trata-se de buscar a verdade, não um
simples acordo entre os interlocutores, pois se pode chegar a um acordo
injusto. E mesmo que não se encontre a verdade, o diálogo tinha um mérito:
desviar-se das opiniões sem fundamento.
Para Sócrates, a
ignorância constitui condição prévia para o saber autêntico. Só quem reconhece
a sua ignorância está capacitado ao aprendizado. Por isso, dizia: "sei que
nada sei". Para chegar a esse estado prévio do não-saber, Sócrates lança
mão de seu método, que é o de perguntar. As perguntas objetivavam descobrir o
conceito que se ocultava na superficialidade do conhecimento. Primeiramente,
aplicava a ironia, que é a forma negativa do diálogo, em que
procurava confundir o interlocutor sobre um conhecimento que acreditava
possuir; depois, aplicava a maiêutica, a forma positiva do diálogo
que, baseado no ofício de parteira de sua mãe, procurava dar à luz um novo
saber. Ele não ensinava, mas criava condições para que o conhecimento brotasse
do ouvinte.
Allan Kardec,
nas questões 9l9 e 9l9a de O Livro dos Espíritos, trata deste tema.
As elucidações são do Espírito Santo Agostinho, que nos diz: "Fazei o que
eu fazia quando vivi na Terra: no fim de cada dia interrogava a minha
consciência, passava em revista o que havia feito e me perguntava a mim mesmo
se não tinha faltado ao cumprimento de algum dever, se ninguém teria tido
motivo para se queixar de mim. Foi assim que cheguei a me conhecer e ver o que
em mim necessita de reforma".
Continuando a
sua explanação, diz-nos que o conhecimento de si mesmo é chave do melhoramento
individual. Caso tenhamos dificuldade de fazer essa avaliação, ou seja,
estejamos indecisos quanto ao valor das nossas ações, perguntemos como
qualificaríamos se a ação tivesse sido praticada por outra pessoa. "Se a
censurardes em outros, ela não poderia ser mais legítima para vós, porque Deus
não usa de duas medidas para a justiça".
Muitas faltas que cometemos passam despercebidas. Adquiramos o hábito de fazer perguntas claras e precisas sobre a nossa conduta. Quem sabe essa persistência não nos livra de muitos erros que cometemos diariamente?
Compilação: https://sites.google.com/view/temas-diversos-compilacao/conhecimento-de-si-mesmo
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O gnothi seauton envolve em primeiro lugar uma tragédia. A tragédia começa com o enigma da esfinge apresentada ao rei Édipo, que pergunta: "Quem pela manhã anda sobre quatro pernas, à tarde sobre duas e à noite sobre três?". (A resposta: o bebê engatinha de quatro, o adulto fica de pé, e o velho anda com a bengala)
Heráclito, o pensador de Éfeso, afirmava já no início do século V antes de
nossa era: "É preciso estudar a si mesmo." Buda dizia: "Quando a
verdadeira natureza das coisas se torna clara para aquele que medita, todas as
suas dúvidas desaparecem, pois ele se dá conta de qual é essa natureza e qual a
sua causa." Temos também a máxima de Sócrates: "Conhece-te a ti
mesmo." No entanto, a máxima completa inscrita no templo de Apolo é:
"Conhece-te a ti mesmo e conhecerás o universo e os deuses." (LENOIR,
Frédéric. Pequeno Tratado de Vida Interior. Tradução Clóvis
Marques. Rio de Janeiro: Objetiva, 2012, capítulo 7.)
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Conhecer-se a Si Mesmo
(Sociedade Espírita de Sens, 9 de março
de 1863)
O que muitas vezes impede que vos
corrijais de um defeito, de um vício, é, certamente, o fato de não perceberdes
que o tendes. Enquanto vedes os menores defeitos do vizinho, do irmão, nem
sequer suspeitais que tendes as mesmas faltas, talvez cem vezes maiores que as
deles. Isto é consequência do orgulho, que vos leva, como a todos os seres
imperfeitos, a não achar nada de bom senão em vós. Deveríeis analisar-vos um
pouco como se não fôsseis vós mesmos. Imaginai, por exemplo, que aquilo que
fizestes ao vosso irmão, foi vosso irmão que vos fez. Colocai-vos em seu lugar:
que faríeis? Respondei sem segundas intenções, pois acredito que desejais a
verdade. Fazendo isto, estou certo de que muitas vezes encontrareis defeitos
vossos que antes não havíeis notado. Sede francos convosco mesmos; travai
conhecimento com o vosso caráter, mas não o estragueis, porque as crianças
mimadas muitas vezes se tornam más e aqueles que as mimam em excesso são os
primeiros a sentir os efeitos. Voltai um pouco o alforje onde são colocados os
vossos e os defeitos alheios. Ponde os vossos à frente e os dos outros para
trás e tende cuidado para não baixar a cabeça quando tiverdes vossa carga à
frente.
La Fontaine
Revista Espírita, junho de 1863.
Oráculo (c. 2000 a.C.) [China]
Poder de profecias e previsões inspiradas por uma divindade
Oráculos
no mundo antigo eram tipicamente figuras religiosas com supostas
habilidades proféticas inspiradas pelos deuses. A palavra "oráculo"
vem do verbo latim orare, que significa "falar", e indica o
papel do oráculo na entrega de mensagens do divino. Sabe-se que oráculos
aconselharam algumas das figuras mais poderosas na história da humanidade, o
que lhes dava posições de poder e influência.
Talvez
o oráculo mais conhecido seja o de Delfos, que se tornou famoso no século VII e
VI a.C. por se comunicar com o deus grego Apolo. O papel do oráculo costumava
ser desempenhado por uma sacerdotisa, que aconselhava políticos, filósofos e
reis quanto a questões de guerras, dever e lei. O fato de figuras poderosas
nessas sociedades dominadas pelos homens aceitarem conselhos de mulheres
demonstra o alto nível de fé que era investido na profecia oracular naquela
época.
Hoje,
os oráculos já não fazem parte do cotidiano. No entanto, I Ching,
um antigo sistema chinês de adivinhação ainda é usado como meio de prever eventos
futuros, tanto nas culturas orientais quanto nas ocidentais.
ARP, Robert (Editor). 1001 Ideias que Mudaram a Nossa Forma de Pensar. Tradução Andre Fiker, Ivo Korytowski, Bruno Alexander,
Paulo Polzonoff Jr e Pedro Jorgensen. Rio de Janeiro: Sextante, 2014.
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