02 julho 2008

Genealogia do Inferno

Inferno — lugar subterrâneo para onde vão as almas dos mortos — não ficou somente na Mitologia. Invadiu várias religiões desde a Antiguidade até os nossos dias. A influência é tão intensa, que mesmo não pertencendo a uma religião, fazemos uso desse conceito para expressar as mais diversas situações de nosso dia-a-dia. Nosso propósito é vê-lo no contexto histórico.

Na Mitologia grega, após a vitória do Olimpo sobre os titãs, foi feita a partilha do universo entre os três irmãos, filhos de Cronos e de Réia: a Zeus coube o Céu; a Poseidon (Netuno), o Mar; a Hades, o mundo subterrâneo, os infernos ou o Tártaro. O inferno, lugar invisível, eternamente sem saída, designa as riquezas subterrâneas da terra, entre as quais se encontra o império dos mortos. Na simbologia, entretanto, o subterrâneo é o local das ricas jazidas, o lugar das metamorfoses, das passagens da morte à vida, da germinação.

No Egito, por exemplo, no túmulo de Ramsés VI, em Tebas, os infernos eram simbolizados por cavernas, repletas de almas danadas. Mas nem todos os mortos eram vítimas de Hades. Eleitos, heróis, sábios, iniciados — todos eles conheciam outras moradas, que não eram os infernos tenebrosos. Ilhas venturosas, Campos Elíseos, onde a luza e a felicidade lhes eram prodigalizadas. 

Na tradição cristã, a conjunção luz-trevas simboliza os dois opostos: o céu e o inferno. Nesse sentido, o céu é o lugar para onde vão as almas dos justos gozar as bem-aventuranças no paraíso; o inferno é o lugar para onde vão as almas dos que morreram em pecado mortal. Lá os esperam as mais trágicas dores: tonéis ferventes, tridentes, enfim, um sofrimento eterno.

Na perspectiva da análise psicológica e ética, o inferno é interpretado em função da psique, cuja figura personificada representa o trabalho intrapsíquico de sublimação ou de perversão. Assim, o Espírito chama-se Zeus; a Harmonia dos desejos, Apolo; a inspiração intuitiva, Palas Atenas; o recalque, Hades. Dentro dessa concepção, o inferno é o estado da psique que, em sua luta, sucumbiu aos monstros, seja por ter tentado recalcá-los no inconsciente, seja porque aceitou identificar-se com eles numa perversão consciente.

Como vemos, a palavra presta-se a muitos significados, mas sempre com um pano de fundo: sofrer o mal cometido.

Fonte de Consulta

CHEVALIER, J. e GHEERBRANT, A. Dicionário de Símbolos (mitos, sonhos, costumes, gestos, formas, figuras, cores, números). 6 ed., Rio de Janeiro, José Olympio, 1992.


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